(*)
Chagas Filho
Eu
vou usar esse espaço para dizer apenas o óbvio, algo estranho, afinal de contas
se está óbvio, nem deveria ser dito. Mas os tempos são estranhos e requerem que
se diga o que todos deveriam saber. É preciso redizer que a Terra não é plana e
que o Brasil é um país racista, sim!
E o racismo aqui é pior do que nos Estados Unidos. Por quê?
Porque
lá é escancarado. Isso é uma desgraça, mas aqui é ainda pior, porque o racismo
está envolto em um manto de cinismo. Aqui ninguém se importa, aqui as vidas
negras não importam, nunca importaram e todos sabem disso, até mesmo aqueles
que insistem em negar.
O
racista que, nesse momento, lê o que eu escrevo sabe que é verdade e sabe que
eu sei que ele sabe, mas o cinismo mantém esse jogo de enganação, de negação da
realidade, de desconexão com os fatos.
Veja:
o assassinato de George Floyd, cidadão preto, por um policial branco, gerou uma
convulsão social que rompeu as fronteiras dos EUA, mas aqui no Brasil temos
centenas de “Georges Floyds”... e ninguém se importa!
Veja:
Agatha,
“menina maravilha”, morta pela polícia no Complexo do Alemão
João
Pedro, 14 anos, assassinado pela polícia no Complexo do Salgueiro
Evaldo
Santos, morto pelo Exército no Rio de Janeiro, com 80 tiros, OI-TEN-TA TIROS!
80!
Claudia
Silva, arrastada até a morte, por uma viatura da PM na Zona Norte do Rio
Amarildo
Souza, pedreiro, morto e ocultado pela Polícia Militar
Miguel,
de 5 anos, caiu do 9º andar do edifício da patroa de sua mãe, que fazia as
unhas e o jogou à própria sorte dentro de um elevador
Esses
são apenas alguns dos exemplos mais famosos. Há outros, há vários. E o que
essas pessoas têm em comum? A cor da pele e a classe social. Mas ninguém se
importa. Grande parte das pessoas prefere se indignar com uma vidraça de banco ou
de boutique quebrada.
Há
quem vá nas redes sociais minimizar as mortes negras; há quem faça piada. Não nos
importamos, porque as pessoas pretas são “matáveis”, descartáveis...
E
ninguém é racista, ninguém se admite racista. Quando são pegos, dizem que é
brincadeira, que têm amigos pretos, que são pretos, nunca é sério, nunca é de
verdade.
Para
quem ainda não viu o óbvio diante dos seus olhos, saiba: o racismo é estrutural
no Brasil, porque foi historicamente estruturado (eu sei que é repetitivo, mas
é necessário repetir). De acordo com Maria Sylvia, presidente do portal
Geledés, e Helena Teodoro, voluntária do Instituto de Filosofia e Ciência
Sociais (IFCS), quando a escravidão foi abolida no nosso País, o Estado se
precaveu por meio de medidas legislativas que possibilitaram a marginalização
dos pretos no Brasil.
Para
quem não sabe, foram criadas leis que proibiam os negros livres de comprarem
terras, por exemplo.
As
pesquisadoras chamam atenção ainda para o fato de que, quando os negros eram
escravos, eram trabalhadores, ou quem você acha que fazia os serviços pesados?
Mas após libertos foram rotulados de vagabundos, malandros, indolentes. Daí houve
um incentivo governamental (um ano depois da Lei Áurea) para a vinda de
europeus ao Brasil, que recebiam terras, animais e até algum dinheiro para
começar a vida aqui. Já os negros, trazidos como bichos em jaulas dentro de
navios, permaneceram sem terra, sem educação e sem trabalho.
Somos
até hoje descartáveis, “matáveis”, a “carne mais baratado mercado”.
Para assistir ao vídeo sobre este assunto, abra o link abaixo:
https://www.youtube.com/watch?v=GRwHdRSn5b8
Para assistir ao vídeo sobre este assunto, abra o link abaixo:
https://www.youtube.com/watch?v=GRwHdRSn5b8
(*)
Autor é jornalista, pedagogo e mestre em Dinâmicas Territoriais e Sociedade na
Amazônia.